quarta-feira, 4 de março de 2015

A dívida limita o espaço de manobra

 

A complicada situação das finanças brasileiras não deixa espaço para um estímulo econômico financiado por títulos da dívida. Sua dívida pública, hoje equivalente a 66% do PIB, é a mais alta dos países do Bric. Seus títulos rendem 13%, mais do que os da Rússia. E poderão subir ainda mais.

A outra agência de classificação de risco, Fitch, coloca o Brasil um ponto acima em alto risco, mas o País tem uma dívida maior, déficits maiores e juros mais altos do que a maioria dos países que entram nessa categoria. Se o crescimento evaporar, haverá certamente um rebaixamento da nota, elevando ainda mais o custo da dívida.

Essa difícil situação não é incomum, mas os problemas monetários do Brasil são. O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, será obrigado a escolher entre duas medidas igualmente odiosas. A primeira é a estratégia da moeda forte: manter os juros altos apesar da economia fraca. A medida sustentaria o real e reforçaria as credenciais do banco na contenção da inflação. 

Mas não só as famílias seriam afetadas pelos juros altos; as empresas também. No conjunto, as grandes empresas brasileiras classificadas pela Fitch registram fluxos de caixa negativos desde 2010. Elas fecharam o hiato reduzindo as economias e emitindo títulos da dívida. A tomada de empréstimos aumentou 23% em cinco anos. Com o risco do aumento da moratória, 20% dessas empresas enfrentam um rebaixamento da sua nota, que em muitos casos é iminente.

Na realidade, uma dura política monetária deveria ser abrandada por uma extensão dos suntuosos subsídios financeiros do Brasil. Bancos estatais como o BNDES e a Caixa Econômica Federal, de varejo, apresentavam 39% de empréstimos em 2009. Hoje, sua parcela equivale a 55%. Como muitas empresas brasileiras não podem pagar os juros do mercado privado (a média para os novos empréstimos corporativos é 16%), o BNDES empresta a taxas favoráveis, atualmente 5,5%. Isso torna o sistema bancário brasileiro uma operação fiscal, diz Mansueto Almeida, especialista em finanças públicas. O financiamento vem do Estado, que toma emprestado a um juro muito maior do que o pago pelas empresas. Quem arca com a diferença, o prejuízo, são os contribuintes. 

A alternativa para Tombini é cortar os juros apesar do aumento da inflação - uma medida audaciosa, considerando a história brasileira. Afinal, a causa do aumento dos preços não é uma economia superaquecida, mas a queda do real, o aumento dos impostos e a seca. A resposta acadêmica seria ignorar a inflação.

Mas o dinheiro barato também seria doloroso. Acentuaria a desvalorização do real, e desse modo aceleraria os aumentos dos preços dos bens importados. A dívida externa, acumulada pelas empresas e pelos governos locais brasileiros em razão da queda dos juros, se tornaria uma carga mais pesada. 

Os dados coligidos pelo Banco de Pagamentos Internacionais (BIS, na sigla em inglês) mostram que as dívidas em dólares subiram de US$ 100 bilhões para US$ 250 bilhões nos últimos cinco anos. Mas o ônus em moeda local subiu muito mais, de cerca de R$ 210 bilhões para R$ 655 bilhões. Aqui também o Estado dá uma mão: o Banco Central oferece contratos de swap para garantir as empresas contra a queda do real. O esquema custou ao banco R$ 38 bilhões somente no segundo semestre do ano passado. 

Diante dessas terríveis opções, será mais provável um caminho intermediário. Os juros serão demasiado elevados para as famílias e as empresas, portanto os financiamentos subsidiados aumentarão. Mas serão demasiado baixos para proteger o real, portanto os custos dos swaps aumentarão também. Ambos os subsídios representarão uma pressão adicional sobre as finanças do governo. Mesclando desse modo a política monetária à fiscal, o Brasil acabará aos poucos tornando ambos ineficientes. Numa economia que caminha para a recessão, este não é um bom lugar para se viver.