quarta-feira, 4 de março de 2015



"BRASIL: um retrato assustador da economia brasileira"

É fácil para o visitante que chega ao Rio achar que não há nada de errado com o Brasil. A classe média com certeza sabe viver: Copacabana e Ipanema distam apenas alguns minutos dos principais centros financeiros e comerciais e de um jogo de vôlei ou o surfe para começar o dia. Os escritórios das corretoras localizados no alto dos prédios têm a visão do Jardim Botânico e dos morros cobertos de vegetação. Mas, mal saímos dos bairros mais ricos, o esplendor desaparece rapidamente. As favelas assoladas pela pobreza e pela violência agarram-se aos morros. O mesmo ocorre com a economia do Brasil: quanto mais profundo é o nosso olhar, pior ela se revela.

O Brasil viu consideráveis altos e baixos nos últimos 25 anos. No início dos anos 90, a inflação subiu acima de 2.000%; desapareceu quando foi introduzida uma nova moeda em 1994. Na virada do século, os déficits do Brasil mergulhavam o País na lama, obrigando o Fundo Monetário Internacional a empreender uma operação de ajuda em 2002. Mas, em seguida, os problemas desapareceram. O Brasil tornou-se um gigante em matéria de crescimento, expandindo-se a uma taxa de 4% ao ano entre 2002 e 2008, enquanto as exportações de ferro, petróleo e açúcar registravam um boom e o consumo interno contribuía com um forte impulso adicional. Agora, o Brasil volta a afundar em problemas. Nos últimos quatro anos, o crescimento foi em média de 1,3%. Uma pesquisa realizada entre 100 economistas pelo Banco Central do Brasil sugere que, este ano, a contração será de 0,5%, seguida por um crescimento de 1,5% em 2016.

Ambos os elementos dessa previsão - uma crise suave e uma rápida recuperação - parecem otimistas. As perspectivas para o consumo privado, que contribuiu para um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 50% nos últimos dez anos, são péssimas. Com uma inflação acima de 7%, o poder aquisitivo dos consumidores vai se esvaindo. Os aumentos elevados dos preços continuarão. O Brasil enfrenta uma grave crise hídrica; como 75% de sua eletricidade são gerados por hidrelétricas, a seca deixa o País sem energia. A fim de evitar apagões, o governo pretende reduzir o seu uso elevando os preços: as tarifas aumentarão até 30% este ano. Com uma desvalorização do real de 10% em relação ao dólar somente no mês passado, o aumento dos preços dos importados provocará uma elevação da inflação.

Não há esperanças de que a renda disponível acompanhe esse ritmo. Um dos motivos é a produtividade do trabalhador brasileiro, que não justifica maiores aumentos. Nos últimos dez anos, os salários do setor privado cresceram mais rapidamente do que o PIB; os dos trabalhadores do setor público, privilegiados em muitos sentidos, tiveram uma evolução ainda melhor. Como o salário mínimo brasileiro está indexado ao PIB e à inflação, uma recessão congelará o valor real dos pagamentos dos milhões de trabalhadores que vivem dele.

Além disso, a austeridade também terá consequências profundas, porque o novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, vai procurar equilibrar as contas. Se Levy reformar o generoso sistema das pensões estatais, a renda dos brasileiros mais idosos congelará.

O pagamento da dívida contribui para os problemas. O total dos empréstimos ao setor privado saltou de 25% do PIB para 55% nos últimos dez anos, com a dívida das famílias equivalente a cerca de 46% da renda disponível. As famílias brasileiras estão muito menos endividadas do que as italianas e as japonesas. Entretanto, os preços desses empréstimos são altíssimos. Oitenta por cento deles referem-se ao crédito ao consumidor, cujo custo chega a ser punitivo (os juros médios dos novos empréstimos chegam a 27%, segundo o Banco Central). 

Quando se soma o pagamento do principal da dívida, o serviço da dívida chega a 21% da renda disponível. Com a redução do ritmo da economia e com a relutância do Banco Central em reduzir as taxas de juros por causa da inflação elevada, os consumidores sentirão o aperto, diz Arthur Carvalho, do Morgan Stanley. No dia 25 de fevereiro, uma pesquisa mostrou que a confiança dos consumidores atingiu o ponto mais baixo dos últimos dez anos.

São poucas as fontes de demanda capazes de compensar essa situação. Os investimentos, que subiram durante oito dos dez anos até 2013, muitas vezes a uma taxa considerável, despencarão em 2015. A Petrobrás, empresa de economia mista, a maior investidora do Brasil, está atolada num escândalo de corrupção que paralisou os gastos e deverá custar até 1% do PIB em investimentos estrangeiros perdidos. No dia 24 de fevereiro, a agência de classificação de risco Moody’s cortou a nota da estatal para grau especulativo; se a Petrobrás não publicar dentro em breve seus resultados auditados, poderá ficar totalmente impossibilitada de tomar dinheiro emprestado.

Exportar não é solução, apesar da queda do real. Cinco países - China, Estados Unidos, Argentina, Holanda e Alemanha - adquirem 45% das exportações brasileiras. Há dez anos, o crescimento médio do PIB dessas economias, proporcional ao seu peso no comércio brasileiro, era 12%; este ano, 5% seria ótimo.

Entretanto, a maior preocupação não é que o Brasil tenha um ano ruim, mas que as alavancas emperradas de sua política levem o País ao marasmo. Em 2014, o Brasil gastou R$ 311,4 bilhões (6% do PIB) com o pagamento dos juros, um aumento de 25% em relação a 2013.

Isso significa que, mesmo se as medidas que o ministro Levy adotar na área fiscal chegarem a funcionar - o seu objetivo é um superávit primário de 1,2% do PIB -, o Brasil nem chegará a sair do vermelho. Tem sido difícil controlar os gastos, porque os pagamentos dos benefícios aumentam apesar da redução do desemprego. Numa recessão, isso será mais difícil ainda.